Hérnia Inguinal por Videolaparoscopia: As 10 Regras de Ouro
- PriMed
- 21 de fev.
- 4 min de leitura
Atualizado: 22 de fev.
Introdução
A hérnia inguinal ocorre quando estruturas intra-abdominais (geralmente tecido adiposo ou alças intestinais) atravessam uma área de fraqueza na região inguinal. O ponto central dessa fragilidade é o orifício miopectíneo de Fruchaud, onde se concentram todas as hérnias inguino-crurais (diretas, indiretas e femorais).
Por se tratar de uma região com anatomia complexa — envolvendo vasos sanguíneos, nervos e ducto deferente (no homem) ou ligamento redondo (na mulher) —, o reparo cirúrgico demanda atenção redobrada.

Nos últimos anos, a técnica videolaparoscópica (em especial as abordagens TAPP – Transabdominal Preperitoneal e TEP – Totalmente Extraperitoneal) consolidou-se como uma alternativa eficiente ao reparo aberto, sobretudo para reduzir dor crônica e acelerar o retorno às atividades habituais.
No entanto, alguns aspectos-chave, como a dissecação adequada, o correto posicionamento e dimensionamento da tela (prótese) e a maneira de fixá-la, são fundamentais para minimizar as taxas de recidiva e complicações pós-operatórias.
A seguir, resumem-se as chamadas “10 Regras de Ouro” para o reparo laparoscópico seguro da hérnia inguinal. Cada tópico aborda desde a abertura inicial do peritônio até a finalização com a desinsuflação, passando pelas recomendações mais recentes sobre tamanho de tela, sobreposição (overlap) e cuidados para prevenção de dor crônica.
A decisão sobre quando operar depende não apenas do tamanho da hérnia, mas também dos sintomas e do perfil clínico do paciente.
1. Abertura do Peritônio na região inguinal
Ponto de referência: cerca de 4 cm acima do anel inguinal profundo.
Finalidade: possibilitar ampla dissecção, evitar o deslocamento da tela ao término e garantir sobreposição adequada.

2. Dissecção em “Zonas”
Estratégia: pode-se dividir a área em medial, lateral e central para organizar a dissecção de forma mais sistematizada.
Vantagem: iniciar pelas zonas anatômicas mais simples (medial e lateral) antes de abordar a região vascular e o anel inguinal profundo, onde há maior probabilidade de variações anatômicas e aderências.

3. Exposição Crítica do Orifício Miopectíneo de Fruchaud
Área-alvo: garantir a visualização completa das regiões onde ocorrem hérnias diretas (medial), indiretas (lateral) e femorais (abaixo do trato iliopúbico).
Âncoras anatômicas:
Sínfise púbica (medial)
Músculo psoas (lateral)
Veia ilíaca (inferior)
4. Exposição do Triângulo Femoral
Objetivo: procurar ativamente possíveis hérnias femorais.
Destaque em mulheres: hérnias femorais são mais frequentes no sexo feminino e têm maior risco de encarceramento/estrangulamento.
5. Parietalização dos Elementos do Funículo
Manobra: baixar o peritônio e expor totalmente o cordão espermático ou ligamento redondo.
Justificativa: evita que a tela seja “repuxada” e dobrada após o fechamento do peritônio, minimizando o risco de recidivas pela borda inferior da malha.
6. Hérnias Indiretas Volumosas: Abandono do Saco
Técnica: em hérnias inguinoescrotais de maior extensão, pode-se realizar uma incisão circular no anel inguinal profundo e deixar o segmento distal do saco (“abandonar o saco”).
Benefícios: reduz sangramento, lesões nervosas e complicações como hematomas ou orquite.
7. Exploração Ativa de Lipomas
Pseudo-hérnias: lipomas do cordão podem simular hérnias ou recidivas em exames de imagem (ultrassom ou tomografia).
Conduta: buscar e reduzir essas gorduras dentro da cavidade peritoneal para evitar diagnósticos equivocados.
8. Overlap de 3 a 4 cm
Dimensões da tela: normalmente utiliza-se 15 × 10 cm ou maiores, a fim de cobrir toda a região inguinal e compensar a retração natural (10% a 20%).
Relevância: sobreposição insuficiente é uma das principais causas de recidiva, especialmente em hérnias diretas.

9. Fixação da Tela na região inguinal
Quando é obrigatória?: hérnias diretas com defeito >3 cm (M3), pois há maior propensão à recidiva.
Métodos:
Grampos (tackers): devem ser usados em pequena quantidade (geralmente até 5-6) para diminuir dor e risco de atingir nervos.
Fixação atraumática (cola ou tela autofixante): alternativa que reduz dor crônica, porém com custos mais elevados em algumas instituições.
Integração da tela: a estabilidade definitiva depende da incorporação tecidual, não apenas dos pontos de fixação iniciais.

10. Desinsuflação Cuidadosa
Passo final: aspirar o espaço pré-peritoneal e observar se a malha permanece no lugar, sem dobrar ou deslocar junto ao peritônio.
Correção de falhas: se houver deslocamento, reabrir e ajustar a posição da tela para evitar recidivas precoces.
Considerações Finais
A abordagem laparoscópica (TAPP ou TEP) para reparo de hérnia inguinal vem se consolidando como padrão de excelência em muitos serviços, principalmente pela menor incidência de dor crônica e boa recuperação pós-operatória. A adoção de técnicas sistematizadas, como as “10 Regras de Ouro” aqui descritas, é essencial para garantir segurança, diminuir as taxas de recidiva e promover melhor qualidade de vida aos pacientes.
A decisão sobre quando operar depende não apenas do tamanho da hérnia, mas também dos sintomas e do perfil clínico do paciente. Em mulheres, deve-se ter atenção especial à possibilidade de hérnia femoral. Já em homens assintomáticos com hérnias pequenas, a vigilância pode ser considerada, sempre discutindo riscos e benefícios de forma individualizada.
No que diz respeito a sobreposição (overlap) e fixação, os dados atuais reforçam que o tamanho adequado da tela e a dissecção completa são mais importantes que o tipo de fixação. Ainda assim, o uso de métodos atraumáticos tende a reduzir a dor pós-operatória, quando logisticamente viável.
Referência Bibliográfica
Claus C, Furtado M, Malcher F, Cavazzola LT, Felix E. Ten golden rules for a safe MIS inguinal hernia repair using a new anatomical concept as a guide. Surg Endosc. 2020 Apr;34(4):1458-1464.
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