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Toracotomia de Reanimação: Atualizações e Diretrizes da Western Trauma Association

  • PriMed
  • 10 de jan.
  • 5 min de leitura

A toracotomia de reanimação emergencial (emergency resuscitative thoracotomy, ERT) é uma técnica essencial em cenários de trauma grave, desempenhando um papel vital na restauração da circulação e no controle de hemorragias intratorácicas.


Recentemente, a Western Trauma Association (WTA) publicou uma atualização relevante, revisando algoritmos e práticas associadas ao procedimento, com implicações significativas para a abordagem clínica.

 

Evolução e Contexto Atual

 

Desde sua introdução nos anos 1960, a ERT passou por avanços contínuos. As novas diretrizes da WTA, baseadas em estudos multicêntricos e revisões sistemáticas, refletem o estado mais atual das evidências científicas. A técnica visa restaurar a circulação cerebral e coronariana em pacientes com sinais de vida (signs of life, SOL), como ventilação espontânea, resposta pupilar e atividade elétrica cardíaca (cardiac electrical activity, CEA). O manejo desses casos requer decisões rápidas e criteriosas, especialmente diante dos riscos inerentes ao procedimento.


No contexto da nova atualização, o fluxograma clínico da WTA organiza o manejo em duas abordagens principais: pacientes com sinais de vida e aqueles sem sinais de vida. Ele considera, ainda, o mecanismo do trauma (contuso ou penetrante) e o tempo de parada assistida como fatores determinantes.


Confira a discussão sobre o assunto no nosso PodCast: Mania de Cirurgia



 

Algoritmo Clínico Atualizado

 

O algoritmo clínico proposto pela WTA introduz mudanças importantes:

  • Separação da CEA dos outros sinais de vida: Isso permite maior especificidade na avaliação clínica.

  • Ultrassonografia cardíaca como ferramenta diagnóstica central: Crucial para determinar a presença de contratilidade cardíaca organizada, especialmente em pacientes com CEA isolada.

  • Incorporação do REBOA (oclusão endovascular com balão da aorta): Alternativa à ERT em lesões extratorácicas selecionadas.

  • Redução da ênfase na ERT para lesões penetrantes de pescoço e extremidades: Refletindo dados que sugerem prognósticos desfavoráveis.

 

A aplicação da ERT é recomendada para:

  1. Pacientes com choque profundo refratário à ressuscitação.

  2. Parada cardiorrespiratória com sinais de vida diferentes de CEA.

  3. CEA isolada com atividade mecânica cardíaca organizada identificada no ultrassom.

  4. Pacientes sem sinais de vida que chegam dentro dos limites temporais descritos, com evidências de contratilidade no ultrassom ou tamponamento cardíaco.

 

Conhecendo o Fluxograma

 

O núcleo do estudo é um fluxograma abrangente que orienta a abordagem em pacientes com parada cardiorrespiratória traumática. Ele organiza o manejo inicial em dois grupos principais: pacientes com sinais de vida e aqueles sem sinais de vida, detalhando critérios baseados no mecanismo do trauma (contuso ou penetrante) e no tempo de parada assistida.


fluxograma de indicação de toractomia de reanimação com quadros e textos

Definição de Sinais de Vida

 

O artigo esclarece que sinais de vida incluem:

  • Ventilação espontânea;

  • Resposta pupilar;

  • Movimentos de extremidades;

  • Presença de atividade elétrica cardíaca organizada.

 

Esse conceito é particularmente relevante em situações de trauma penetrante, onde, mesmo com atividade elétrica sem pulso (AESP), a presença de contratilidade mecânica pode indicar um coração funcional, embora vazio.

 

Critérios Temporais e Decisões de Manejo

 

Para pacientes sem sinais de vida, o tempo desde a parada é crucial:

  • Em traumas contusos, o limite é de 10 minutos.

  • Em traumas penetrantes, 15 minutos.

 

Se esses limites forem ultrapassados, a recomendação é encerrar os esforços, considerando a sobrevida praticamente nula e o impacto negativo no uso de recursos e na equipe médica.

 

O Papel do Ultrassom

 

O ultrassom cardíaco emergiu como ferramenta central nesse contexto, auxiliando na identificação de tamponamento cardíaco ou contratilidade organizada. Em pacientes com AESP, mas dentro da janela temporal ideal, o ultrassom permite decisões precisas, reduzindo intervenções desnecessárias.

 

Indicações de Toracotomia

 

O fluxograma detalha as principais indicações de toracotomia:

  1. Trauma penetrante torácico com sinais de vida: Indica-se o procedimento para tratar tamponamento cardíaco ou hemorragias intratorácicas.

  2. Trauma penetrante infradiafragmático: A toracotomia permite clampear a aorta, redirecionando o fluxo sanguíneo para órgãos vitais.

  3. Exceções específicas: Ferimentos supradiafragmáticos são contraindicações, exceto para manejo de doadores ou suporte temporário para despedidas familiares.


    Cirurgião realizando o atendimento de um paciente vítima de trauma dentro do hospital em uma maca
    O atendimento de vítimas de trauma em parada cardiorrespiratória é diferente daqueles cujo motivo inicial da PCR é um problema de contratilidade cardíaca.

 

Passo a Passo Técnico

 

A técnica padrão envolve:

  1. Incisão inicial: Toracotomia anterolateral esquerda no quarto espaço intercostal, com expansão bilateral em “clamshell” se necessário.

  2. Controle de hemorragias: Identificação e reparo de lesões pulmonares ou cardíacas, incluindo evacuação de hemotórax maciços e pericardiotomia em casos de tamponamento.

  3. Oclusão aórtica: Realizada com clamp vascular para redirecionar o fluxo sanguíneo para o cérebro e coração.

  4. Gerenciamento de embolias aéreas: Controle do ponto de entrada de ar e aspiração de ar nas câmaras cardíacas, quando necessário.

 

O ultrassom cardíaco emergiu como ferramenta indispensável na identificação de tamponamento cardíaco ou contratilidade organizada. Estudos indicam que sua implementação reduz toracotomias desnecessárias, tornando o processo mais preciso e eficiente.



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Considerações de Prognóstico e Controvérsias


A taxa de sobrevivência em traumas penetrantes torácicos pode alcançar 35%, especialmente em ferimentos cardíacos isolados. Por outro lado, traumas contusos apresentam taxas de sobrevida muito inferiores. O uso do REBOA tem sido explorado como uma alternativa em lesões extratorácicas, mas sua implementação ainda gera debates.

Um aspecto crítico levantado pelo artigo é o uso limitado da compressão cardíaca externa em pacientes com CEA e contratilidade mecânica no ultrassom. Estudos indicam que a compressão pode agravar a exsanguinação nesses casos, sugerindo a toracotomia direta como abordagem preferencial.

 

Discussão e Implicações Práticas

 

O artigo reafirma a importância de avaliações rápidas e precisas no manejo do trauma. Embora o ultrassom seja amplamente recomendado, o uso do REBOA, dispositivo de balão intravascular, é controverso devido às limitações técnicas e logísticas.

Por fim, o estudo destaca a necessidade de evitar intervenções fúteis, como massagens cardíacas em corações com contratilidade organizada, que podem agravar o quadro ao invés de melhorar.

 

Áreas para Pesquisa Futura

 

Diversos aspectos da ERT ainda precisam de maior investigação, incluindo:

  • Comparação entre massagem cardíaca aberta e fechada.

  • Impacto do REBOA na sobrevida de pacientes em diferentes cenários.

  • Papel da ERT em doações de órgãos.

  • Influência da experiência institucional nos resultados.

 

Considerações Finais

 

A ERT representa uma intervenção altamente especializada e decisiva na sobrevivência de pacientes em choque traumático grave. As atualizações da WTA fornecem um framework robusto e baseado em evidências, orientando decisões clínicas com maior precisão e eficácia.


Ao integrar avanços como o ultrassom cardíaco e o REBOA, o algoritmo reflete uma abordagem mais moderna e criteriosa. Pesquisas futuras são essenciais para refinar ainda mais as práticas e melhorar os desfechos, especialmente em contextos desafiadores como traumas contusos e lesões extratorácicas.

 

Referências

 

  1. Western Trauma Association. Adult emergency resuscitative thoracotomy: A clinical decisions algorithm. J Trauma Acute Care Surg. 2024;97(6):961–968.

 

  1. Western Trauma Association. Adult emergency resuscitative thoracotomy: A procedure guide. J Trauma Acute Care Surg. 2024.

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Guest
Jan 27
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